Wednesday, July 04, 2007

Medo


Ri,


Quando meus olhos se abriram essa manhã – quase tarde – pensei que venho eu devendo a ti, há algum tempo, uma resposta. Não escrevi ainda porque andei calada. A resposta veio agora, aqui debaixo das cobertas, de calcinha, camiseta e remela nos olhos. Perguntou-me como anda a minha vida nesse tempo em que ficamos sem nos ver ou falar, e confesso que ando aflita com o modo como vem batendo meu coração.
Ele que sempre teve um comportamento exemplar, deu para nesses tempos, bater estranho. Parece-me que tem andado com más companhias. Uns e outros aí que se dizem modernos, independentes, que fazem o que bem entendem e não gostam de dar satisfações... Não entendo! Fora sempre tão carente.
Outro dia notei quando saíram todos juntos. Rindo alto, falando besteiras. Há quem diga que iam muito seguros de si, mas eu duvido. Em turma é mais fácil acreditar-se pleno e feliz. Mas a pergunta que faço para esse bando de corações que se dizem tão livres é como é que batem quando estão sozinhos em frente ao espelho.
Pois o meu coração está rebelde. Não me escuta nem tão pouco me dá atenção. Deu pra querer cair na noite todo dia e voltar só quando o Sol já raiou. Falou-me sem rodeios que eu era careta e não entendia nada dos novos tempos. Que compromisso sério era démodé. O queeee?
Também deu para ficar olhando para todos os lados e cantos procurando um outro qualquer que possa servi-lhe uma ou duas noites. Disse que não quer ter ninguém no seu pé, cobrando-lhe horários e explicações. Quer ser livre e estar só. Emendou até, com voz segura, que não se apaixonaria tão cedo. Assim, com essa petulância adolescente de quem acha que sabe e pode tudo.
Não é que ele, todo cheio de si, trombou com um outro coração, já conhecido seu, em uma dessas noites libertinas! E como eu vinha lhe avisando sem que ele me desse ouvidos, sentiu um calafrio e um suadouro logo que bateu o olho no coração conhecido. Sim, porque esse daí era há muito, um coração com potencial para virar amor seu. Tentou fugir para o banheiro inutilmente. Seguido que foi rendeu-se ao outro.
Na manhã seguinte contou menos de vinte e correu para casa. Disfarçou para o espelho, não pronunciou uma palavra ao me ver e recolheu-se no quarto. Pouco depois o telefone tocou e ele novamente rendeu-se em um novo encontro. Seguiram assim nas semanas seguintes. Começou até a entrar no compasso certo trazendo-me um alívio que pouco durou.
Dias depois ficou agitado e palpitante. Andava inquieto por aí ensaiando dizeres que nunca eram ditos a ninguém. Foi guardando para si suas palavras e em uma das bebedeiras corriqueiras confessou que não procuraria mais o outro coração. Porque raios? Vinha se envolvendo demais, via-se prestes a amar, e com isso iria se perder de si próprio. Era melhor sair de cena, decretou. Como se não houvesse nenhuma outra alternativa possível, pensei.
Assim decidido não deu explicações maiores e deixou de telefonar. Fez do outro coração uma lembrança vaga em seu dia a dia. Preencheu o espaço vazio ao lado dos amigos como se nada tivesse acontecido. Arquivou o assunto e seguiu adiante batendo em um descompasso que vem me enlouquecendo. Ele que outrora era fluido agora tornara-se líquido e vinha escorrendo pelas frestas perdendo-se da sua essência maior: a capacidade de amar.
Essa noite em meus sonhos ele fazia um tum-tum-tum gostoso deitado em seu colo. Estávamos jogados os dois na areia em uma das tantas viagens passadas. Despertei saudosa e querendo saber se o seu coração, depois que nos separamos, também tomou-se de medo e fechou-se para a lei natural dos encontros. Ou, se mesmo machucado, respirou fundo e abriu os braços aceitando a vida.
Espero que esteja bem e que possamos nos ver em breve.


Beijos